Como a comunidade LGBTI+ vivencia a Esclerose Múltipla

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Conseguir atendimentos de saúde de forma respeitosa e com qualidade nunca foi fácil para pessoas que se identificam como LGBTI+. Mas, quando a pessoa também tem Esclerose Múltipla é ainda mais importante encontrar profissionais que tenham respeito no cuidado, para que o tratamento seja eficaz e humanizado.

Quando se vive com Esclerose Múltipla (EM), pode ser difícil se relacionar com pessoas que não têm a condição. De acordo com a Sociedade Nacional Norte-Americana de Esclerose Múltipla, cerca de 1 milhão de pessoas nos Estados Unidos têm EM – menos de 1% da população. Mas quando falamos de pessoas que também são lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, queer/questionando ou tem uma identidade semelhante, como intersexo ou assexual (LGBTI+), pode parecer ainda mais difícil. Pessoas LGBTI+ historicamente têm sido tratadas de forma inadequada no sistema de saúde, mas existem maneiras de se proteger e obter cuidados de qualidade e respeito sendo alguém LGBTI+ e com EM.

Esclerose Múltipla, Orientação Sexual e Saúde Mental

Ter Esclerose Múltipla, além de ser LGBTI+ pode aumentar a probabilidade das pessoas apresentarem a necessidade de uma maior atenção à sua saúde mental. “Aproximadamente 50% das pessoas com EM podem ter algum episódio depressivo pelo menos uma vez na vida. Enquanto aproximadamente um terço das pessoas com EM poderão ser diagnosticadas com um transtorno de ansiedade”, diz Samantha Domingo, psicóloga do Pacific Wellness Hub em Portland, que trabalha com pessoas com EM, incluindo a população LGBTI+. “A imprevisibilidade da Esclerose Múltipla, combinada com seus sintomas que alteram a vida, também pode ter um impacto significativo na identidade de alguém.”

Além disso, pesquisas dizem que a identidade sexual pode afetar a saúde de maneira geral. “Sabe-se que pessoas LGBTI+ em geral podem apresentar maior vulnerabilidade na saúde mental e física, em comparação com pessoas heterossexuais cisgêneras, devido ao estresse que as minorias vivem e às experiências ao longo da vida”, diz William Conte, especialista em EM e diretor do Instituto de Neurociência dos Hospitais Metodistas em Merrillville, Indiana.

Kaci Bell, 28 anos, foi diagnosticada com Esclerose Múltipla em 2017. Ao crescer, a residente de Addison, Texas, sentia que sua sexualidade não era aceitável. “Cresci em uma família com uma mãe solteira, onde ser qualquer coisa além de heterossexual não era aceitável. Eu tentei suprimir e negar meus sentimentos de atração por pessoas do mesmo sexo, e isso só causou conflito dentro de mim”, ela lembra.

Quando começou a morar sozinha, ela se assumiu como bissexual, mas agora se identifica como pansexual (atraída por pessoas de todos os tipos de gêneros ou orientações sexuais). “Encontrar-me na pansexualidade solidificou minha ideia de mim mesma e do que significa amar”, diz Kaci.

Sendo uma “minoria dentro de uma minoria”

Quando você tem Esclerose Múltipla e é uma pessoa LGBTI+, pode ser difícil descobrir onde você se encaixa. “Pessoas com identidades marginalizadas, como aquelas com deficiência e LGBTI+, podem ter dificuldade em se ver representadas em suas comunidades”, diz Samantha.

Os sintomas da Esclerose Múltipla também podem dificultar o convívio social e o namoro. “Estudos têm mostrado que pessoas LGBTI+ com EM tendem a participar de menos atividades dentro de sua comunidade após o diagnóstico de EM, o que pode contribuir para se sentirem mais isoladas”, diz William.

Bell também é preta, o que a torna uma “tripla minoria”. “Na comunidade preta, ter uma deficiência – seja visível ou invisível – não é algo discutido abertamente. Da mesma forma, a sexualidade também não”, ela diz. “Como uma mulher preta que também é queer e vive com uma deficiência, essa tríade é única e não se encaixa perfeitamente em nenhum ambiente social.”

Desafios para pessoas LGBTI+ no sistema de saúde

Um estudo publicado em outubro de 2021 no periódico científico Multiple Sclerosis and Related Disorders descobriu que pessoas LGBTI+ e com Esclerose Múltipla enfrentam desafios únicos para terem cuidados médicos de qualidade, devido a fatores como:

  • Discriminação social
  • Homofobia e transfobia
  • Falta de cuidados de saúde culturalmente competentes

Embora nos Estados Unidos, a Lei de Cuidados Acessíveis proíba os prestadores de cuidados de saúde e as seguradoras de saúde de discriminar – inclusive com base na orientação sexual e identidade de gênero – muitas pessoas LGBTI+ ainda enfrentam discriminação em ambientes de cuidados de saúde. De acordo com uma pesquisa de 2017 realizada pela Escola de Saúde Pública da Harvard T. H. Chan, National Public Radio e a Fundação Robert Wood Johnson, quase um sexto dos adultos LGBTI+ já sofreram discriminação no consultório médico ou em outro ambiente de saúde, enquanto um quinto dos respondentes LGBTI+ afirmaram ter evitado buscar atendimento médico por medo de discriminação.

Nota da AME: Como é no Brasil?

No Brasil, a Política Nacional de Saúde Integral (LGBTI+) foi criada em 2011 com o objetivo de reconhecer a vulnerabilidade desta população. A política visa ser uma orientação a ações legitimadoras de atenção integral a população LGBTI+, seguindo o propósito do princípio da equidade presente na constituição federal. A política busca ampliar o acesso a ações e serviços de qualidade reconhecendo a história de discriminação, preconceito e exclusão, também nos serviços de saúde. 

Leia mais sobre esse tema no Pebmed: A Política Nacional de Saúde Integral (LGBTI+): o que você precisa saber?

Conheça também a cartilha sobre saúde da população LGBTI+ do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (UnAIDS) no Brasil.

Pessoas LGBTI+ também enfrentam discriminação em suas vidas cotidianas, o que pode afetar ainda mais a saúde

Além disso, “a pesquisa clínica em Esclerose Múltipla não costuma abordar o entendimento do contexto único de indivíduos LGBTI+ – que pode ser tão variado dentro do grupo – então, na melhor das hipóteses, os prestadores de cuidados de saúde podem não estar totalmente preparados para compreender as necessidades específicas de pessoas LGBTI+”, diz Domingo.

“Já enfrentei minha parcela justa de desrespeito na área da saúde, em vários níveis”, diz Bell. “Tive interações bizarras com profissionais médicos por ser mulher, preta, deficiente mas com mobilidade, e LGBTI+. É como se escolhessem uma dessas coisas sobre mim para tornar toda a consulta desconfortável”.

Como pessoas LGBTI+ podem obter o melhor cuidado para a Esclerose Múltipla

Aqui estão algumas maneiras de você falar por si mesma(o) e receber cuidados respeitosos e oportunos para sua esclerose múltipla.

Encontre um(a) médico(a) especialista em EM com quem você se sinta à vontade

“Assim como em qualquer área da saúde, pessoas LGBTI+ devem se sentir confortáveis com seus profissionais de saúde. Mesmo que estejam recebendo o cuidado mais avançado, se a pessoa não confia ou não se sente confortável com o(a) médico(a), o cuidado pode ser comprometido”, diz Conte. Também é importante trabalhar com um(a) neurologista especializado(a) em EM, em vez de um(a) neurologista geral, acrescenta.

Identifique uma pessoa na equipe de saúde em quem você confie plenamente

Pode ser exaustivo ser a pessoa que educa os outros sobre como é ser LGBTI+ e ter uma deficiência ou viver com uma doença crônica, diz Domingo. “Às vezes, um(a) profissional de saúde mental, um(a) fisioterapeuta ou um(a) enfermeiro podem ser a pessoa em quem você confia. Conte com esses(as) profissionais de confiança para ajudar a falar sobre suas necessidades e avançar pelas complexidades do sistema de saúde”, diz.

Manifeste-se

Seus(uas) profissionais de saúde podem querer ajudar a se sentir mais confortável, mas não sabem como. “Se for seguro, forneça feedback às pessoas e instituições se você notar algo que pode ser mudado para fazer você se sentir valorizado(a) em relação às suas experiências e identidade”, diz Domingo. “Isso pode ser algo tão simples quanto mudar os formulários da clínica para abrangerem todas as identidades de gênero”.

Mantenha sua rede de apoio

Mesmo que não saibam exatamente pelo que você está passando, ainda é importante manter contato com sua família e amigos(as). “Pessoas LGBTI+ com Esclerose Múltipla devem se certificar de não se isolarem, pois fatores de proteção contra o estresse incluem apoio de pessoas próximas, ou seja família, amigos e sua comunidade”, diz Conte.

Encontre pessoas que você se identifique

Existem outras pessoas LGBTI+ com Esclerose Múltipla por aí. É possível compartilhar histórias nas redes sociais para se conectar com outras pessoas. “Criei meu Instagram para combinar abertamente essas partes da minha identidade e criar um novo espaço na mesa”, diz Bell. “Encontrei confiança em estar na área da ‘tripla minoria’. Isso inspirou outras pessoas nas redes sociais que são uma combinação de serem pretas, se identificarem como LGBTI+ e terem EM. ‘Os feedbacks positivos que recebi dessas comunidades me ajudaram a perceber que na verdade não estou sozinha nessas dificuldades’, diz ela.

Tenha orgulho de quem você é

“Não pare de ser um ativista (atuar/falar e se impor) sobre/por si mesmo(a)”, Bell instiga. Ela incentiva todos(as) a serem a representação que desejam ver. “Conscientize sobre a Esclerose Múltipla e os diferentes tipos de pessoas que convivem com ela: LGBTI+ inclusos!”

 

Leia mais no site da AME:

 

E no site da CDD:

 

Tradução e adaptação: Redação AME – Amigos Múltiplos pela Esclerose

Fonte: Everyday Health

Escrito por Erica Patino, em 10 de abril de 2023, revisado por Michael R. Yochelson.

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