Não existe cura, mas já se começa a falar em remissão da patologia. As terapias orais e os anticorpos monoclonais, conforme demonstram estudo de extensão, confirmam sua eficácia graças à ausência de surtos e à redução de deficiências.
Tem sido uma longa travessia no deserto de uma doença muito incapacitante que durante décadas pouco se pôde fazer contra a perda da mielina que recobre as fibras nervosas quando ela é atacada pelo próprio organismo. Mas graças aos avanças da medicina, tanto diagnóstica quanto terapêutica, hoje se pode conviver com a esclerose múltipla, durante muitos anos, sem apresentar uma deficiência física, por exemplo. Apesar de não existir cura, cada vez se controla melhor com a ajuda de fármacos modificadores do curso da doença que visam reduzir o número, a frequência, a intensidade dos surtos e a quantidade e volume das lesões que aparecem no cérebro e medula do paciente.
Mais precisamente, durante o 32º Congresso do Comitê Europeu para o Tratamento da EM (ECTRIMS), já se fala de uma nova era na abordagem da doença.
“Nos últimos cinco anos se produziu uma grande mudança nessa doença. Agora se diagnostica de uma forma mais rápida e, graças aos novos tratamentos, estamos realizando uma medicina personalizada. Segundo as características clínicas do paciente e os biomarcadores sanguíneos, é possível conhecer sua evolução, prognóstico e possível resposta aos diversos medicamentos” explica o médico Rafael Arroyo, chefe do Serviço de Neurologia do Hospital Universitário Quirónsalud, de Madrid e do Complexo Hospitalar Ruber Juan Bravo. Compartilha desta opinião o médico Antonio Yusta, chefe do Serviço de Neurologia do Hospital Universitário de Guadalajara, que acrescenta: “todos os tratamentos aprovados vão demonstrando sua eficácia e segurança e, graças a isso, já temos a capacidade de personalizar e individualizar o tratamento. Hoje em dia, a grande vantagem é que temos opções a oferecer”. Um exemplo disso encontramos em dois remédios: teriflunomida e alemtuzumab.
Um ao dia
No caso da teriflunomida, uma terapia oral que se administra uma vez ao dia, a médica Celia Oreja-Guevara, chefe de seção da Unidade de Esclerose Múltipla do Serviço de Neurologia do Hospital Clínico San Carlos de Madrid, explica que “esse é o único tratamento de primeira linha que em dois estudos completamente independentes (Temso e Tower), obteve os mesmos resultados, quer dizer, uma redução de deficiência em 30-35% que se mantém há dez anos”. Segundo os dados que foram apresentados no Congresso, “o medicamento continua sendo seguro, se tolera bem, não aparece nenhum efeito colateral não esperado nem infecções oportunistas, nem maior risco de tumores. Estamos diante de uma doença crônica, o que faz a eficácia e a segurança no tratamento serem chave”, enfatiza Arroyo.
Estes novos tratamentos estão baseados no conceito NEDA (Nenhuma evidência de atividade da doença) “cujo objetivo final é que estes pacientes não tenham nenhum tipo de atividade clínica nem radiológica. Dizer que o paciente está em remissão é dizer que todas as variáveis que temos para medir como está a doença está dando negativo”, assegura o médico José Meca Lallana, neurologista e diretor da Unidade de Esclerose Múltipla do Hospital Universitário Virgen de la Arrixaca, em Murcia. De acordo com a extensão de dez anos do estudo Temso, enfatiza Oreja-Guevara, “seguimos tendo o mesmo número de pacientes livres de atividade clínica e radiológica. Assim mesmo, tem-se visto como a teriflunomida reduz a atrofia a longo prazo e se correlaciona, portanto, com a redução da deficiência”. Outro aspecto importante da teriflunomida é, segundo Meca, que “se comprova como depois de oito anos de tratamento os pacientes que começaram o estudo principal, 63% continuam e apresentam uma taxa de surtos de entorno de 0, 1-0, 2%”.
Dado que a EM se caracteriza porque as células encarregadas de defender o organismo, as células T, atacam e deterioram a mielina, não é de se estranhar que os tratamentos estejam focados a partir dos linfócitos T. No entanto, as últimas pesquisas afirmam que tanto as células T como as B são as responsáveis pelo dano causado pelo processo inflamatório na doença. Nesse sentido, a médica Luisa María Villar, chefe do Serviço de imunologia do Hospital Universitário Ramón y Cajal de Madrid, adverte que “na EM intervém os linfócitos B e T, que são as células chave da resposta imune inata, sobretudo células de micróglia e macrófagos que residem no sistema nervoso central”.
Dois ciclos
O fato de atuar contra esses dois tipos de células tem permitido que, graças aos novos anticorpos monoclonais, o paciente possa, inclusive esquecer-se que está enfermo. Esse é o caso do alemtuzumab, cuja vantagem reside em que sua administração é algo totalmente inovador, pois se dá em dois ciclos. No primeiro, durante cinco dias e, depois de doze meses, o segundo, que consta de mais três dias de tratamento..
“Se segue confirmando a longa duração de sua ação no sentido de que com dois ciclos de tratamento separados em um ano os pacientes estão estáveis, livres de atividades clínica e radiológica por cinco anos. É um dado que não se havia visto nunca antes em nenhum remédio”, explica Arroyo. A eficácia duradoura de alemtuzumab se explica, segundo Oreja-Guevara, “nessa 'repovoação' de linfócitos CD4, CD8 e CD19, que é o que faz com que se mantenha o efeito. Precisamente, os resultados de atrofia em seis anos seguem sendo significativos, porque os pacientes estão estáveis, não há aumento de deficiência e, portanto, podemos falar de remissão da doença”.
A particularidade dessa medicação é que “reprograma o sistema imunológico, de maneira que o paciente possa passar longos períodos de remissão sem se tratar”, acrescenta Villar. No entanto, Meca insiste que “temos que ter muita precaução porque estamos falando que há pacientes que, depois de dois ciclos nunca mais terão que voltar a tratar-se, mas terão que estar assistidos dia a dia porque, em qualquer momento, poderia surgir qualquer problema relacionado com esse “reinício” do sistema imune. Essa prudência sobre a tolerância e segurança se vê compensada por sua tremenda eficácia”.
Pese ao arsenal terapêutico disponível, a realidade mostra que autonomia pra escolha não se tem por igual. “Existem lugares onde se colocam certas dificuldades em poder fazer uma prescrição livre por parte do neurologista. Os custos destes tratamentos são elevados, mas os benefícios que vão ter e o financiamento de custos a longo prazo é um custo efetivo. As autoridades sanitárias, por meio dos conselhos de saúde, farmácias ou hospitais colocam, em alguns lugares, dificuldades para a livre escolha por parte do médico em tratar o paciente com o que nós acreditamos que vá ser o melhor. Essa é uma realidade que temos que defender pela qualidade de vida do paciente”, conclui Arroyo.
Tradução Redação AME – Amigos Múltiplos pela Esclerose
Leia a matéria original em La Razón.
La Razón