Entrevista exclusiva com Larissa Dorneles – Terapeuta Ocupacional e convive com EM

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Oi, Lari, tudo bem? Em primeiro lugar, queremos te agradecer por ter topado a entrevista, para nós, é uma alegria poder contar com você nesse material, tão importante para quem convive com EM 🙂

Conta um pouco para a gente um pouco melhor sobre você, o diagnóstico de EM, seu trabalho como TO?

Sou Larissa Dorneles Uavniczak, tenho 31 anos, casada, mãe do Otto, de seis meses. Sou Terapeuta Ocupacional, formada pela Universidade Federal de Santa Maria/RS, cidade onde resido atualmente e que, coincidentemente, apresenta a maior incidência de EM no Brasil, quase o dobro da média nacional. Meu trabalho em TO está voltado para a área da neurologia, que foi o campo que mais estudei durante a graduação.

Meu diagnóstico de Esclerose Múltipla foi fechado em 2017, mas desde 2014 eu já havia começado a sentir os primeiros sintomas, tais como visão turva, dor na cervical, paralisia facial, fraqueza muscular e muita fadiga. O primeiro surto fez-me perder o movimento do braço esquerdo. Após 3 dias hospitalizada, fazendo pulsoterapia (medicação), o membro foi recuperando a mobilidade e o vigor, retornando ao normal.

O que exatamente um profissional de TO faz?

O Terapeuta Ocupacional é um profissional da saúde que trabalha com a ocupação humana global, focando principalmente nas áreas: saúde, educação e campo social, cultural e artístico. Trabalhamos para que o cliente que esteja apresentando algumas alterações físicas, sensoriais, mentais, psicológicas e/ou sociais, seja por um período de tempo, seja definitivamente, possa conquistar graus de autonomia e independência na execução de suas atividades de vida diária, que incluem alimentação, autocuidados, locomoção etc. Procuramos sempre buscar um enfoque individual, pois cada sujeito é único e possui seu próprio contexto de vida, e o terapeuta ocupacional precisa primeiramente entender todas essas relações e, a partir disso, planejar e realizar suas intervenções junto a esse sujeito, por meio de diversos recursos terapêuticos, com o objetivo de fazê-lo conseguir utilizar suas potencialidades de forma autônoma e independente nas atividades vitais e de seu interesse.

Porque é tão importante falar em prevenção de queda e de que maneira a terapia ocupacional pode ajudar?

Trabalhar com prevenção de quedas é de extrema importância, principalmente em se tratando da Esclerose Múltipla, uma vez que essa doença acarreta esse risco e o assunto carece de maiores estudos e materiais de orientação, pois o foco da Terapia Ocupacional na prevenção de quedas está direcionado ao público idoso. Eu sentia muita necessidade de orientações sobre prevenção de quedas no meu dia a dia quando apareceram os primeiros sintomas da EM, mas fui encontrando maneiras de deixar minha casa mais segura de acordo com a especificidade do ambiente e das minhas necessidades a partir dos conhecimentos que fui adquirindo enquanto acadêmica e, posteriormente, Terapeuta Ocupacional e, também, do autoconhecimento que vamos conquistando de nossa vivência.

O risco de quedas está presente não só durante os surtos, mas também quando se manifestam os sintomas, que podem ocorrer mesmo quando estamos mantendo o tratamento medicamentoso adequadamente. Caso você note estar mais fadigado, deve evitar fazer atividades que exijam muito esforço. Um exemplo pessoal que posso dar é que, quando me sinto fadigada, já levo para o banheiro uma cadeira para que possa tomar meu banho tranquilamente, evitando assim o risco de que, caso a fadiga aumente inesperadamente, uma queda possa vir a ocorrer, ainda mais em um ambiente tão instável e quanto o chão molhado de um banheiro. Aprendi com o tempo e com as experiências que devo reconhecer meus limites, do que posso ou não fazer por ser diagnosticada com EM e, mesmo conhecendo meus limites, muitas vezes nosso corpo não responde da forma corriqueira e precisamos estar preparados para esses momentos. Por exemplo, eu sei que não posso atravessar uma rua movimentada sem semáforo, pois, se por acaso eu precisar acelerar meu passo, minha perna poderá travar e estarei me colocando em risco, então eu só atravesso a rua onde tem faixa de segurança ou quando o semáforo recém fecha, mesmo que não esteja sentindo nenhum sintoma, pois eu assim sei que terei o tempo necessário para atravessar a rua sem me colocar em riscos. Fui me adaptando a minha nova realidade na medida em que os obstáculos foram surgindo.

Nesse viés, o Terapeuta Ocupacional irá avaliar cada cliente, suas necessidades ou dificuldades, e poderá introduzir medidas de proteção ao ambiente, elaborar um plano de orientações para identificação de riscos e limitações, traçar um plano de medidas de proteção, adaptar objetos que fazem parte da execução de atividades de vida diária, o que irá beneficiar sobremaneira a qualidade de vida de cada cliente, uma vez que lhe devolve, ainda que parcialmente, a autonomia e independência com segurança, pois cada pessoa possui suas limitações e especificidades que devem ser analisadas e contempladas singularmente nas estratégias a serem adotadas.

Onde as pessoas podem encontrar profissionais de T.O com facilidade pelo Brasil?

Poderá encontrar TOs trabalhando em hospitais, escolas, clínicas de reabilitação, ambulatórios, Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e consultórios particulares.

Existe algum programa no SUS que disponibiliza acesso a esses profissionais?

 A Terapia ocupacional compõe os SUS em várias áreas, tais como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF), Centro de Reabilitação em Saúde do Trabalhador (CRST), Hospital-Dia, Assistência à Saúde do Idoso, do Paciente Neurológico, entre outros.

Embora esteja previsto no SUS, a presença efetiva de TOs nesses serviços vai depender de cada município, por isso é importante verificar se a sua cidade dispõe desses profissionais e, em caso afirmativo, demandá-los.

Quais dicas você poderia dar para ajudar uma pessoa a melhorar a mobilidade e a segurança dentro de casa, ambiente de trabalho, por exemplo?

A dica de ouro para todas as residências, independente de algum morador ter alguma limitação, é manter as áreas de circulação livres de obstáculos, tais como fios soltos, objetos jogados, móveis no meio do caminho, passagens labirínticas, tapetes sem fixação, bem como manter cadeiras e bancos sempre nos seus devidos lugares. Dar preferência a móveis sem quinas pode evitar maiores gravidades em casos de acidentes. A presença de animais exige atenção redobrada, sendo preferível manter os de maior porte fora de casa. Preferir locais bem iluminados; possuir um abajur ao lado da cama, para não necessitar caminhar no escuro. Evitar cadeiras, sofás e camas baixas e sem apoio.

Para quem sente muita fadiga ou fraqueza muscular, é sempre bom deixar uma cadeira de banho ou de plástico (resistente) dentro do box, bem como instalar barras de apoio no banheiro. Ter por perto um sino ou campainha para quando necessitar de alguma ajuda. Esses mesmos cuidados de prevenção em casa são igualmente válidos para o ambiente de trabalho. Além do mais, informar sobre a doença e orientar os colegas mais próximos também é de extrema importância, principalmente como precaução para casos de surtos súbitos.

Estas são dicas gerais, mas quando houver algumas limitações específicas, sempre é aconselhável recorrer a um terapeuta ocupacional para uma avaliação mais minuciosa e adequação a singularidades, de modo a maximizar a qualidade de vida e dirimir os riscos.

Existe alguma adaptação que a pessoa consegue fazer sozinha, sem auxílio de um profissional?

Existem diversos materiais disponíveis nas unidades básicas de saúde, bem como na internet, contendo indicações básicas do que você pode fazer em casa para dirimir os riscos e prevenir quedas, porém quase que exclusivamente focados em idosos, mas que podem ser aproveitadas e adaptadas à Esclerose Múltipla de maneira geral. Mas para os casos mais específicos, é indispensável a orientação correta de um terapeuta ocupacional, que irá avaliar a melhor maneira de confeccionar essa adaptação de acordo com a necessidade apresentada pelo cliente, a especificidade do ambiente, quais materiais devem ser usados de acordo com as atividades de vida diária de cada um.

O que você poderia dizer em relação a prevenção de queda e porque é tão importante falar sobre isso e participar de estudos, para quem convive com EM?

Tanto como profissional quanto como diagnosticada com EM, acho de extrema importância discutir sobre esse assunto relacionado à EM, pois quando falamos de prevenção de quedas e terapia ocupacional, iremos encontrar muitos materiais sobre o tema vinculado ao idoso, mas os pacientes com esclerose múltipla, que geralmente são jovens, possuem muitas queixas em relação à ausência de estudo e materiais de orientações para quem convive com a EM, uma vez que muitos dos sintomas causam dificuldade de locomoção, falta de equilíbrio, fadigas, perda súbita de mobilidade.

Assim, participando dos estudos e respondendo aos questionários, vamos poder mapear os principais riscos apresentado pelos diversos sintomas, elaborar estratégias de orientação e intervenção e, assim, ajudar outros sujeitos que possuem a mesma dificuldade que a nossa.

Você tem algum e-mail de contato para quem quiser falar diretamente com você?

Meu e-mail é laradorneles@gmail.com

Lari, muito obrigada pela entrevista, esperamos que esse conteúdo ajude muitas pessoas!

Um forte abraço e conte sempre com a gente 🙂

* Estamos promovendo um estudo inédito aqui no Brasil sobre Prevenção de Queda e EM, se você ainda não está participando clique aqui!

Equipe AME.

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