Incorporação de novos tratamentos da Esclerose Múltipla ao SUS leva mais de um ano

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Atualização constante dos PCDT agilizaria acesso às mais recentes tecnologias em saúde na Esclerose Múltipla e em outras doenças pelo SUS. Especialistas avaliam que os protocolos deveriam ser anualmente revisados para garantir acesso aos novos tratamentos de forma mais rápida.

Hoje, quando um PCDT é revisto, leva 6 meses para ser publicado no diário oficial e a incorporação leva mais 6 meses para chegar ao público.

Guarulhos, dezembro de 2021 – 

O processo de incorporação de novas tecnologias a serem seguidas pelos gestores do Sistema Único de Saúde (SUS) é feito através dos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT). Estes protocolos são elaborados pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) e incluem recomendações de condutas, medicamentos ou produtos para as diferentes fases evolutivas de uma doença ou do agravo à saúde. 

Os PCDT também indicam tratamentos em casos de perda de eficácia e de surgimento de intolerância ou reação adversa relevante, provocadas pelo medicamento, produto ou procedimento de primeira escolha. Nos últimos dois anos, a Conitec publicou duas consultas públicas (CP)  das atualizações do PCDT de Esclerose Múltipla e quatro CPs de diferentes medicamentos (Alentuzumabe, Tetraidrocanabinol + canabidiol, Ocrelizumabe e Natalizumabe). 

Conforme o neurologista Denis Bichuetti, os tratamentos das doenças mudam ao longo dos anos. “Além de novas medicações, têm atualizações a respeito do conhecimento e do resultado de remédios atuais. Em Esclerose Múltipla, por exemplo, houve uma época em que não se tratava do primeiro surto. Hoje a gente trata. Houve uma época que determinadas medicações eram usadas sequenciais: primeira linha, segunda e terceira. Hoje a gente usa as medicações de acordo com o momento de doença de cada um, se está ou não ativa. Houve uma época que, uma vez que a gente migrasse para uma medicação mais forte, a gente nunca voltava atrás. Agora a gente aprendeu que pode voltar atrás. Só pra citar alguns exemplos de evolução”, afirma. 

Bichuetti explica que os PCDT deveriam ser atualizados anualmente: “Eu diria que, do ponto de vista burocrático, para facilitar um pouquinho a construção do documento, uma revisão anual bastaria. Isso não significa que os PCDT mudariam a todo momento do ano, mas significa que alguém poderia olhá-lo e pensar: ‘Tem algo que eu preciso mudar aqui?’. E, claro, as mudanças, quando ocorressem, fossem prontamente disponibilizadas. Hoje, quando um PCDT é revisto, leva 6 meses para ser publicado no diário oficial e, quando isso acontece, a incorporação leva mais 6 meses para estar disponível ao público. Ou seja, quando eu reviso o documento, ele começa a ter efetividade prática para o prescritor e o paciente 1 ano e meio depois”. 

Esclerose Múltipla pode ter efeitos irreversíveis

De acordo com informações do Ministério da Saúde, a EM é uma doença inflamatória, desmielinizante e neurodegenerativa, que envolve o Sistema Nervoso Central. A patologia acomete usualmente adultos jovens, dos 20 aos 50 anos de idade e é, em média, duas vezes mais frequente em mulheres. Estima-se que, no mundo, dois milhões e meio de pessoas convivam com a esclerose múltipla.

A EM, se não tratada, pode aumentar o risco de progressão da deficiência causada pelo dano neurológico. O tratamento precoce é fundamental para a redução do risco de progressão da deficiência causada pelo dano neurológico. Para Bruna Rocha, vice-presidente da associação Amigos Múltiplos pela Esclerose (AME) e que convive com a EM desde os 14 anos, a inclusão dos medicamentos no PCDT deve ser feita o mais rápido possível. 

 “Não só o protocolo de EM, mas todos os PCDT deveriam ser revistos com frequência porque atualmente a gente tem muitas tecnologias novas disponíveis no mercado. No momento em que essa tecnologia é permitida no Brasil e é aprovada para entrar no sistema público, ela precisa entrar no PCDT o quanto antes para que seja disponibilizada para as pessoas”, comenta.

Mesmo com a aprovação pela Conitec para uma tecnologia entrar no SUS, se o protocolo não for atualizado, a medicação não é disponibilizada, o que atrasa o eventual tratamento. “Quando vemos a entrada de um novo medicamento no SUS através de uma consulta pública sabemos que só vai realmente chegar para o paciente no momento em que estiver constando no PCDT”, explica.

A neurologista Raquel Vassão ressalta que, nos últimos 30 anos, houve uma evolução significativa no tratamento da Esclerose Múltipla e que atualizar frequentemente o PCDT é tentar acompanhar a ciência e acrescenta: “Quanto melhor o tipo de evidência científica a gente tiver e mais rápido a gente conseguir avaliá-la, melhor. Isso tanto para incorporar novos medicamentos quanto para retirar outros”. A especialista explica: “Saúde tem custo. Alguns medicamentos, às vezes, não são tão eficazes. Óbvio que é bom ter mais opções mas, se a gente tem um orçamento apertado e eu puder retirar opções que não fazem sentido do ponto de vista de eficácia, de perfil de segurança e etc, talvez isso seja uma possibilidade de ter melhores opções no protocolo. Assim, estou economizando num remédio que não é tão bom e invisto em outros que são melhores”. 

Em setembro, a Conitec abriu a consulta pública de número 78 para atualização do PCDT de Esclerose Múltipla. “É importante que tanto médicos quanto pacientes e associações participem sempre. A consulta pública é importante”, avalia o neurologista Rodrigo Kleinpaul. O especialista percebe que há avanços importantes na versão mais recente do PCDT de EM, de setembro de 2021. “Nós evoluímos muito de fevereiro para cá no último protocolo. Sei que faltam medicamentos, mas a gente sabe que o especialista quer escolher o melhor”, diz.

“A participação social é nosso direito como democracia, poder dar nossa opinião sobre as decisões em saúde. Acredito que, quanto mais as pessoas entenderem os processos de como as coisas chegam até nós, melhor nossos direitos serão concedidos. Então, se a saúde é um direito e um dever do estado, e a gente souber como fazer isso funcionar, talvez o SUS, que é incrível e muito bem feito, funcione melhor justamente por estarmos cobrando na ponta”, finaliza Bruna Rocha.

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