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Olá pessoal,

Tudo bem com vocês? Essa semana ando em uma ‘correria’, na velocidade de uma esclerosada, e tento me acalmar ouvindo músicas durante os trajetos rotineiros. O tempo de ir e vir por vezes torna-se o único momento reflexivo… e isso é sinal de que as coisas não vão muito bem. Então decidi compartilhar com vocês um pouco dessas reflexões em pedaços.

Chico Buarque me acompanha nesses momentos e a pergunta que ecoa é “o que será que me dá?” Uma música em três variações e em todas elas a pergunta é a mesma. O que será que será essa coisa incontrolável? “O que será que será?”

Todos que já se apaixonaram podem imaginar o que poderia ser a resposta para essa questão cantada em três versões. A paixão por outra pessoa é o que mais se aproxima dessa emoção do desejo. Mas quero pensar que o Desejo, sim, com letra maiúscula, essa emoção que nos tira do lugar de forma incontrolável e nos mobiliza em todos os sentidos da vida, não só apenas quando nos apaixonamos por alguém. É o Desejo que nos impulsiona… aquele sonho que fazemos acontecer a qualquer custo. A qualquer custo! Ficamos com brilho nos olhos, nada nos cansa.

“Que todos os suores me vêm encharcar.

Que todos os meus nervos estão a rogar.

Que todos os meus órgãos estão a clamar.

E uma aflição medonha me faz implorar

O que não tem vergonha, nem nunca terá.

O que não tem governo, nem nunca terá.

O que não tem juízo”

No dia do evento Pedale, promovido pela AME em 28 de agosto, em Florianópolis, encontrei com amigos esclerosados que eu não via há um ano e, papo vem, papo vai… “o que você anda fazendo?”, “como vai a vida?” e ouvi de uma amiga: “estou trabalhando tanto… aquelas coisas… faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço… estou fazendo tudo que uma esclerosada não deveria fazer… pouco tempo para mim e correndo muito”. Mas o que ela fazia? Estava no lugar do seu Desejo. Ela brilhava os olhos enquanto falava sobre seu trabalho. O Desejo pode nos doer, mas não tem governo!

Quando soube do meu diagnóstico conheci pessoas com EM aposentadas “por invalidez”. Aquilo foi como uma bigorna caindo sobre o meu Desejo. Quem me conhece sabe o quanto me realizo na minha atividade na universidade. Estar entre jovens especialmente! Não apenas de pessoas que viveram menos que eu, mas de pessoas que estão há mais tempo jovens e a universidade é um lugar privilegiado para esses encontros. Não falo de pessoas que parecem mais jovens visualmente, mas especialmente se mantem jovens porque exercitam inovações em formas de pensar. Pensar junto, construir pensamentos, pensar o pensamento… não há algo mais sedutor! Aqui está o meu Desejo… uma falta que “me bole por dentro […] que brota a flor da pele”.

Alice não sabe que Desejo não tem governo! Desejo reprimido faz adoecer! Chico Buarque me ajudou a entender porque já tive depressão depois do diagnóstico. E significo aqui o porquê minha depressão não me causa vontade de dormir em um quarto escuro, como comumente se sabe sobre esse mal, mas ao contrário, não consigo parar, dormir ou desacelerar.

Então em meio a essas reflexões fragmentadas, de trajetos curtos, no tempo de uma música, li o texto escrito pelo José Isaías, publicado em 21 de setembro, no seu blog aqui no espaço da AME, e novamente chorei com seus escritos. Existe uma frequência entre o que eu sinto e o que ele é provocado a escrever? Isso me comove. (Esse é um dos presentes que a AME me proporciona… se não fosse o blog acho que eu demoraria muitos anos para descobrir… ou nunca descobriria… explica um pouco aquela paixão juvenil que me fez jogar tudo para alto em Minas Gerais… nos idos anos de 1990… mas esse é outro assunto…) Voltando ao meu ritmo, a música de Chico Buarque e o texto do Isaías… é esse mesmo Desejo que me faz precipitar sem medida a conquistar a qualquer custo uma lentidão possível. Quem sabe seja um caminho que pode me manter na docência, na pesquisa… entre jovens e livros?

Obs. Escrevi esse texto um pouco depois da publicação do José Isaías e desde então algumas coisas aconteceram. Precisei fazer uma pulsoterapia, a princípio pelo sintoma de uma surdez novamente, mas, depois de uma ressonância soubemos de uma lesão bem grande em uma região cognitiva. Uma região de associações livres… ouvi essa informação do meu médico e pensei… isso mexe nos meus instrumentos de trabalho e Alice realmente não está interessada nos meus desejos!!! 

https://www.youtube.com/watch?v=CEb1hdnBjc8

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