Pesquisa conduzida pela Associação Amigos Múltiplos pela Esclerose (AME) constatou falhas sistemáticas nas entregas de medicamentos para Esclerose Múltipla por meio do Sistema Único de Saúde. O estudo de três fases, entre os anos de 2015 e 2017, teve participação de 250 pacientes em cada etapa, em todas as regiões brasileiras.
Para Gustavo San Martin, superintendente da AME, há duas possibilidades lógicas para as falhas. “Ou se trata de um grave problema de gestão, inabilidade que impacta a vida e a saúde de muitas pessoas, ou então seria uma absurda política pública do atraso, para gerir às avessas os recursos que, sabemos, são escassos. Nenhuma dessas hipóteses é aceitável porque a saúde do paciente não pode esperar. Para uma pessoa com EM, tempo é cérebro”.
O problema foi confirmado nos Estados da Bahia, Ceará, Minas Gerais, Mato Grosso, Pará, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo e no Distrito Federal, com atraso de um a três meses na entrega de Avonex, Betaferon, Copaxone, Fingilomode, Rebif (22 e 44) e Tysabri, ou com a ausência total do remédio.
Aproximadamente 13 mil pacientes de EM recebem drogas de alto custo por meio do SUS no País. Entre as pessoas entrevistadas pela AME, metade afirmou que não havia medicamento na farmácia do governo na data programada para retirada. Em 2015, a falta chegou a 57,1% dos casos. No ano seguinte esse número caiu para 53,4% e, em 2017, chegou a 47,19%.
“Se não há determinado remédio em um Estado, não há em nenhum, porque a compra dos medicamentos é feita de forma centralizada pelo Ministério da Saúde”, ressalta o superintendente da AME.
O estudo da AME verificou também que 73,2% dos entrevistados relataram atrasos na entrega em 2015. Em 2016, foram 61,7% e, em 2017, 47,2%.
“Manter uso do remédio por mais de 80% do tempo minimiza os efeitos da doença. Quando essa adesão é interrompida, há falha no tratamento, surgem lesões no cérebro e na medula, provocando sequelas, que podem ser irreversíveis, com problemas de longo prazo”, explica o neurologista Denis Bernardi Bichuetti, professor adjunto da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e membro da equipe multidisciplinar da AME.
“Para um paciente que usa o medicamento semanalmente, por exemplo, é ideal não haver intervalos sem programação prévia. Quando a pessoa passou por uma crise, a primeira obrigação do médico é perguntar se ela está tomando os remédios conforme recomendado”, diz Bichuetti.
O neurologista ressalta que a interrupção no uso dos medicamentos faz parte de um critério que avalia as falhas do tratamento, não da droga em si. “Paciente que não faz uso correto fica desprotegido, com maior risco de sofrer surto e ter sequelas”, comenta. “Se o tratamento precoce faz diferença, começar esse tratamento o mais cedo possível e trocar a medicação para uma substância mais potente amplia a eficácia. O uso contínuo oferece maior benefício”, diz o especialista.
O professor cita o estudo ‘Survival in MS : A randomized cohort study 21 years after the start of the pivotal IFN ß-1b trial’, da American Academy of Neurology”, apresentado em 2012, que avaliou o uso do Betaferon por 21 anos, desde seu lançamento em 1999. “Esse estudo constatou que o uso correto do medicamento fez diferença na mortalidade dos pacientes”, completa Bichuetti.
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PROVIDÊNCIAS – “A AME levará os dados sobre a falta de medicamentos ao conhecimento do Ministério Público Federal (MPF) para que sejam adotadas as providências cabíveis”, afirma o advogado Marco Aurelio Torronteguy.