Oi, pessoal! Estou prestes a completar um ano de diagnóstico e esta é uma data que marca muito a vida de quem descobre qualquer patologia que terá de conviver por toda a vida, acredito eu. Tomarei a liberdade de escrever um pouco para as pessoas que escolhi, a dedo, para dividirem essa trajetória comigo e para você leitor, não personagem desse texto, fica a reflexão ao final, combinado?
Em 1º de abril de 2018, apresentei dormência no lado direito do rosto que se arrastou por mais de um mês e isso incomodava bastante e causava muito medo das possibilidades que me cercavam. Descobrir a esclerosinha foi um misto de alívio e medo (muito!). Os primeiros 3 dias eu chorava muito, não sentia fome e, nos primeiros meses, acordava, todos os dias, fazendo um check list para verificar se tudo estava funcionando direitinho no meu corpo. Era muito angustiante a sensação que havia perdido as rédeas de minha vida (essa ainda é uma luta constante).
Diante desses sentimentos e da instabilidade emocional que trouxeram, comecei uma reflexão e decidi que precisava de ajuda: de Deus, da medicina/psicoterapia e de amores.
Eu não sei se você acredita em Deus mas vou relatar a minha experiência. Cresci no catolicismo, indo à missa todos os domingos. Acreditar Nele foi uma escolha minha, construída com base em experiências inexplicáveis. De fato, eu andava afastada Dele, sempre ocupada, trabalhando muito ( cuidado com o vazio de uma vida ocupada demais, ok?). Retornei a buscá-lo e vivenciei experiências de fé belíssimas! Eu tive oportunidades de aprender tantos caminhos pelo amor, mas, de fato, ignorei. A dor me fez sentir a presença de Deus e Nossa Senhora muito mais fortes em minha vida. É inexplicável! Deus é top!
A segunda decisão importante nessa caminhada foi escolher bem os profissionais que iriam me acompanhar. Eu já tinha um neurologista na minha cidade devido à enxaqueca, conhecido por sua competência. O que as pessoas não sabem muito sobre ele e que é tão importante para quem está fragilizado é sua característica de humanização. Eu vi no semblante dele e no agitar das pernas inquietas o desconforto em me dar o diagnóstico. Eu chorei bastante, ele se esforçou muito para me deixar tranquila sobre a tempestade na qual estava entrando e me deu um abraço apertado, muitos beijos e me deixou sair do consultório com a seguinte frase: “Eu estou com você nessa”. Decidimos buscar outra opinião para fechar o diagnostico e, uma amiga-imã, encontrou outro neurologista em uma capital vizinha para tal missão ( que puta sorte eu tive!). Deparo-me, mais uma vez, com um ser humano que abandona uma relação distante entre médico e paciente, e acolhe, orienta, tranquiliza, se preocupa e é um divisor de águas nos novos hábitos alimentares. Não posso deixar de citar a secretária dele (maravilhosa!) que tem um astral contagiante e sempre dá um jeitinho na agenda lotada desse rapaz!
Sempre ouvi como é importante ter afinidade com seu terapeuta e, com a minha, isso aconteceu de cara ( que sorte, mais uma vez!). Sou acolhida em risos e lágrimas, convidada a repensar e refletir sobre tantos comportamentos que a esclerosinha saiu do palco! Minha terapeuta me ajudou (muito!) a decidir que é só um diagnóstico e que a imprevisibilidade faz parte da vida de todos, eu apenas não havia me dado conta.
Eu escolhi, a dedo, entre os amores com quem dividiria essa fragilidade. Não, não é fácil conviver com uma doença crônica, sem cura (até o momento!), que causa tantos sintomas, que exige tantos cuidados. Não é fácil usar medicação injetável, lidar com reações dolorosas, mudar tanto o estilo de vida. Então, meu querido leitor, eu escolhi com quem dividir o diagnóstico. Meus pais tiveram, por longo tempo, a reação de negação, eles fingiam que aquilo não estava acontecendo e isso me irritou muito. Aos poucos, compreendi que era forma deles de lidar com aquela dor. Tenho certeza que, se fosse possível, eles pegavam a esclerosinha para eles ou bateriam um papo reto pra ela sair de minha vida! Hahahaha Essa foi minha primeira escolha entre os amores: compreender as reações. Meus irmãos oscilavam entre sofrer, chorar, negar e pesquisar! E essa era a reação deles, e eu precisava aceitar e entender a manifestação de amor em cada reação dessa.
Dentre os amigos, eu escolhi com quem dividiria esse momento. Aos poucos, fui escolhendo, fui falando, dividindo e tornando meu caminhar mais leve. E fui feliz nessa escolha porque fiz com calma, paciência e pedindo sabedoria ao universo (sempre!). Eu dividi com amigas de infância que tiveram reações diversas ( e isso também me incomodou!) entre a preocupação e a negação. Mas era apenas a forma de cada uma reagir a isso. Eu dividi com amiga desde o ensino fundamental que, no primeiro encontro após o diagnóstico, a esclerosinha nem foi tema de conversa porque ela se preocupou em fazer a seguinte pesquisa na internet: “ como ajudar quem tem esclerose múltipla” hahahahaha Eu escolhi gente que vê na vida uma festa e com sua alegria, gargalhada alta e alto astral, me ajudou a também decidir que é só um diagnóstico. Eu escolhi gente que tinha acabado de se desentender comigo, mas que engoliu o orgulho e a raiva ( sem razão hahahaha) para me dar a mão e entrar nesse barco comigo. Eu escolhi gente que nem mora na minha cidade mas que me dá tanto amor, mesmo de longe. Eu escolhi gente que os pais levaram meu nome para grupo de oração, pedindo por minha saúde e longevidade (lindo isso, né?). Eu escolhi amigas que a universidade me deu, contrariando a teoria que não se faz amigos neste ambiente, que engoliram o choro quando lhes contei ( o semblante de cada uma denunciava isso! Hahaha) e me deram abraços apertados, palavras positivas e mais amor. Eu escolhi dividir, dentre essas, com alguém que chorou tanto, que pesquisou tanto, que me deu tanto amor, mesmo a quilômetros de distância. No trabalho, eu tive uma chefe que chorou junto e marcou exames para mim ( que sorte de novo, hein?!) e divido com os escolhidos a dedo as angústias, dores e lutas porque se tornaram amigos que enxugaram lágrimas, se preocupam e mandam músicas lindas ( Ouçam Bonequinha de pano – Pedro Valença). Eu escolhi dividir com quem poderia se afastar, mas escolheu ficar.
Então, meu caro leitor, eu quero dizer uma coisa a você: escolha com quem vai dividir seu diagnóstico. É fantástico o trabalho de várias pessoas que mostram como é viver com esclerose múltipla nas redes sociais. Se você sente-se pronto e bem resolvido para isso, faça! Ver essas pessoas faz muita diferença na vida de quem acaba de receber o diagnóstico. Se você não está pronto ( e essa é uma reflexão muito pessoal), faça escolhas. É preciso escolher com sabedoria com quem dividir energia, afinal, saúde não está relacionada apenas ao que se come, bebe e atividade física. O mundo anda mesmo muito hostil (já diz a música de Los Hermanos – De onde vem a calma) e o poder de fogo das pessoas anda aflorado. É a era do caos, dos rancores, da contestação e críticas não solicitadas, contra o que estiver na moda. Temos o hábito de esperar do outro a mesma reação nossa, ou compreensão e compaixão diante de nossas dores. Nem sempre encontraremos e, não esperar isso, é um exercício e luta diária que faz bem a alma. Exercite!
Aos meus personagens, obrigada por tudo e por tanto!
Jucielma