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Eu me cuido, faço exercícios, minha alimentação é recheada de frutas, verduras, fibras.. nada pode dar errado. Faço checkup todo ano, tenho acompanhamento de ginecologista, cardiologista, endocrinologista, dermatologista, dentista e todos os ista que manda o manual.pdf do ser humano saudável.

O prazo para realizar cuidados desse tipo foi prorrogado. Tá rolando pandemia e todo mundo tem que ficar em casa! Não é prioridade se seu corpo não sinaliza problemas.

E foi em casa, 7 dias por semana e 24 horas por dia, que nossos divertidamentes começaram a brigar.

Era choro no horário do jornal da manhã, bombardeio de mensagens com notícias pesadas, áudios de médicos em desespero, imagens de caminhão transportando vários corpos. Mas a noite, tinha live. Tinha Safadão, Marília Mendonça, Jorge e Mateus.. tinha cerveja gelada, um petisco gostoso e vamos todos dormir como se não houvesse pandemia amanhã.

Dia seguinte, outro jornal, outro choro, outros áudios.. outra live.

Lazer fora de casa virou sinônimo de crime. Ninguém pode ir ao parque, tá tudo fechado. As aulas têm que voltar. E voltaram…

Então teve choro de novo, teve joelho no chão em oração, teve mais choro. Teve choro de filho, choro de mãe, choro de professora. Nem live de Sandy e Junior serviria para trazer alegria. Ainda tinham os áudios, ainda tinham as mortes, ainda tinha tanto sofrimento.

Os números se transformaram em nomes. O coração apertou. Mais choro.

Teve briga com amigos, teve governante ignorando sofrimento de centenas de milhares de famílias. E mais choro.

Teve alegria e coisa boa também. Teve dança e São João na sala de casa. Teve vídeo chamada com um bocado de gente querida.

Teve vários aniversários com bolo e coxinha. Com pouquíssima gente, mas teve aniversário.

Mesmo assim, teve o divertidamente da ansiedade comendo sem controle. Comendo muito mesmo.

Teve roupa que não cabia mais. Teve mais comida. Muito mais. Teve descuido, vontade de quebrar o espelho.

2020. Que ano, que ano! Por causa das consequências da pandemia, esse ano jogou na nossa cara todos os problemas que eram tratados como poeira sendo empurrada para baixo do tapete.

Se eu não vejo, não existe, ué?

Casais em pé de guerra. Mães em exaustão. Crianças sem brincadeiras com os amigos.

Parece que não tem prazo para acabar. Precisamos cuidar de toda essa poeira que saiu debaixo do tapete e se espalhou pelo ar.

A saúde mental, diferente de tantas outras coisas, não pode esperar.

Saúde mental é sobre cuidar de si em primeiro lugar, ser gentil consigo, saber dizer não, reconhecer seus próprios limites. Não consigo, não posso, não dá, preciso de ajuda. Pode ser amanhã? Hoje, eu não tô bem.

Saúde mental é sobre cuidar de quem a gente ama, mesmo quando essa pessoa não quer ser cuidada. É aprender a ouvir sem julgamentos, é dar a mão, o ombro.. é dar amor.

É permitir se isolar em meio ao isolamento. Todo mundo precisa de um momento sozinho. O filho, a mãe, o marido.

Puxa vida como foi difícil. Mas não foi. Tá sendo. A pandemia não acabou. E a saúde mental? Ela não pode esperar.

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