Sombra do capacitismo

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A Invisibilidade do Capacitismo: Reflexões de Uma Mente Consciente em Um Corpo Limitado

Viver com uma condição crônica é, em muitos aspectos, uma redescoberta constante de si mesma. Quando recebi o diagnóstico de esclerose múltipla, encontrei um universo no qual o meu corpo, outrora ágil, passou a exigir ferramentas auxiliares para se mover. E foi aí que o mundo ao meu redor também começou a se revelar sob uma nova luz, ou talvez uma nova sombra – a sombra do capacitismo.

Capacitismo. Uma palavra que carrega em si o peso de séculos de preconceito disfarçado de gentileza. É sutil, insidioso e, muitas vezes, mascarado por intenções que, à primeira vista, parecem nobres. Mas, assim como uma flor que brota em solo contaminado, essas intenções são envenenadas por uma visão de mundo que diminui, minimiza e reduz a pessoa à sua deficiência.

O capacitismo não me vê

Já fui alvo desses olhares. Olhares que evitam encontrar os meus, que preferem desviar para o meu marido, como se minha presença fosse uma mera extensão da dele. Perguntas para ele, como se eu fosse incapaz de responder por mim mesma. Frases de consolo que, na verdade, consolam apenas quem as diz, e não quem as ouve. Esse é o capacitismo: a incapacidade de enxergar além da deficiência, de reconhecer a pessoa inteira que existe por trás de cada limitação física.

O capacitismo não é sempre explícito. Ele se manifesta em gestos e palavras que, por mais bem-intencionados que sejam, carregam em si a crença de que a deficiência é algo a se lamentar, algo que precisa de conserto, ou pior, algo que torna a pessoa invisível. Não é raro que, ao estar em público, eu perceba olhares que se desviam, que evitam encarar a realidade de uma mulher em uma cadeira de rodas. Talvez seja desconforto, talvez seja medo do desconhecido. Mas o que eu sinto, o que cada pessoa com deficiência sente, é uma solidão imposta por uma sociedade que prefere não lidar com a nossa existência.

Mas existe algo mais profundo, uma camada oculta que passa despercebida até mesmo por aqueles que se consideram aliados. É a suposição de que uma vida com deficiência é uma vida menor, menos digna, menos feliz. Quando alguém se compadece de mim, quando me trata com uma gentileza exagerada, quase infantilizada, o que essa pessoa realmente está expressando é o medo de que, no meu lugar, ela não conseguiria ser feliz. O que ela não entende é que minha felicidade, minha dignidade, minha força, não se definem pela minha condição física, mas pela minha humanidade, pela minha capacidade de amar, de criar, de sonhar.

O capacitismo, portanto, não é apenas um preconceito; é uma cegueira. Uma cegueira que impede as pessoas de verem além da cadeira de rodas, além das limitações físicas. É uma recusa em reconhecer que, apesar das dificuldades, eu sou uma pessoa completa, com desejos, medos, esperanças e, acima de tudo, com voz própria.

Contra o capacitismo, escute a minha voz

Escrever este texto é, para mim, um ato de resistência. É uma maneira de afirmar que eu existo, que eu tenho algo a dizer, e que meu valor não se diminui pela minha condição física. É um chamado para que todos nós, como sociedade, nos livremos dessa visão estreita e limitante, e comecemos a enxergar uns aos outros como seres humanos plenos, dignos de respeito e consideração.

Convido você, leitor, a refletir sobre suas próprias atitudes, suas próprias palavras, seus próprios olhares. Será que, em algum momento, você já caiu na armadilha do capacitismo sem sequer perceber? Será que já deixou de reconhecer a humanidade plena de alguém por causa de uma deficiência? A mudança começa com a conscientização, e a conscientização começa com a disposição de questionar a si mesmo.

Eu sou uma mulher com esclerose múltipla. Eu sou uma pessoa com deficiência. Mas, acima de tudo, eu sou uma pessoa. Assim como você, mereço ser vista, ouvida e respeitada por quem sou, e não apenas pelo que aparento ser.

Este texto é uma tentativa de lançar luz sobre as sombras do capacitismo, para que possamos, juntos, criar um mundo onde ninguém seja invisível, onde todos sejam vistos, ouvidos e valorizados como seres humanos inteiros, com todas as suas complexidades e singularidades. Que possamos aprender a enxergar além das aparências, e a reconhecer a dignidade e a humanidade de cada pessoa, independentemente de suas limitações físicas.

“A deficiência não está no corpo, mas nos olhos que se recusam a ver a plenitude da alma que habita nele” – siga a Karen Lopes em @minhavida_esclerosada

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