Internação – Superação

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Oi gente! Beleza?

Por esses dias, precisei de internação para três dias de pulsoterapia para tratar um surtinho leve.

Vou tentar resumir o que são essas internações pra mim.

A primeira coisa que tenho que falar é que depois que eu caio nas mãos da equipe de enfermagem, sou muito bem atendida. O hospital é um dos maiores empregadores da cidade, então tenho muitos amigos trabalhando aqui e acabei fazendo outros nas minhas internações anteriores. Estou entre amigos e isso é muito bom.

Mas até chegar nesse ponto a demora é grande e desnecessária.

Como todos já devem saber, faço meu tratamento em Porto Alegre, há 13 anos, desde o diagnóstico definitivo. Não porque eu queira, mas porque não tenho a opção de fazê-lo aqui. Meu “sonho dourado” seria meu médico e minha enfermeira (chamo de meus, porque os adoro e considero, tomei posse) viessem trabalhar em Cachoeira atendendo pelo SUS. A única etapa do tratamento que posso fazer por aqui são as pulsos e ainda assim, dá vontade de desistir.

Trouxe o encaminhamento do médico de Porto Alegre, todo bem explicadinho.  Mas fui direto à emergência, porque é o caminho que conheço, certamente não é o ideal, mas é onde sei ir e que funciona.

A primeira dificuldade reside no fato de que numa emergência as prioridades são os casos mais urgentes, então só resta esperar. Quanto a isso, não me dou o direito de reclamar.

Quando o médico plantonista atende ele pode até ser atencioso. Nesse caso foi. Mas ele é médico, não manja nada dos paranauê administrativos e burocráticos. Mesmo eu já tendo dito para todos porá quem já falei que preciso ser internada para fazer as pulsoterapias, não porque eu queira, mas porque o hospital não tem habilitação de hospital-dia e o SUS não cobre o tratamento se for feito na emergência, o médico insiste em fazer o contrário. Eu até entendo: a internação, na prática, é desnecessária, mais dispendiosa e ocupa leitos necessários pra outros pacientes. Mas não é culpa minha, nem mesmo minha exigência. Na hora que a enfermagem pega pra fazer é que vão realmente perceber que tenho razão e só então providenciar os trâmites para internação.

Aí é um calvário: a atendente me faz um monte de perguntas e passa o caso pra chefia, que vem falar comigo e repete o tanto de perguntas, aí checam as informações com a administração. Mas aí tem que ter outro médico que não seja o plantonista para assinar e acompanhar a internação, só que a essa altura já são nove da noite (cheguei as cinco) e fica difícil buscar um em casa.

Lá pelas tantas a coisa se resolve e aí fica tudo certo. O que aborrece é que não te dão ouvidos logo de cara, ficam nesse jogo de empurra e acabam transformando algo que poderia se resolver em 15 minutos numa epopeia que leva horas.

Outra coisa irritante, duas perguntas que o médico designado para me acompanhar me fez. A primeira: “porque tu não faz isso lá em Porto Alegre?”  – Sério, tive vontade de estrangular ele. Depois, no outro dia, até simpatizei com o médico, mas nessa hora minha vontade era de ser bem desaforada. Engoli a vontade demanda-lo TNC e expliquei com toda a paciência que eu nem tenho, que já faço essas viagens há 13 anos, que elas não são passeio, estou cansada, estou em surto, tenho filhos, casa, uma vida pra dar conta e é a única coisa que ainda consigo fazer por aqui.

A segunda pergunta: “porque tu não passaste num clínico antes?” Provavelmente esse seria o caminho mais correto a seguir, talvez por isso eu tenha engolido novamente a vontade de manda-lo longe e desistido de dar explicação. Seria muito difícil, exaustivo e desnecessariamente estressante faze-lo entender que eu teria que esperar mais 10, 15 dias por uma consulta com um clínico e correria o risco dele não ser capaz de diagnosticar o surto e nem dar prosseguimento ao encaminhamento do meu neuro. Primeiro porque eles não entendem nada de EM, segundo porque se sentem ofendidos quando viemos com recomendação pronta de outro médico. São criaturas muito sensíveis, é preciso saber lidar com os Egos inflados e eu não tenho mais paciência pra isso. Não sou obrigada.

Na verdade, estou cansada do SUS. Ele funciona, sou testemunha disso. Mas só para quem conhece bem “o caminho das pedras” e isso é uma tarefa quase impossível, pois a burocracia muda TODOS OS DIAS. Quando a gente acha que sabe como agir, eles vão lá e mudam tudo.

O próprio atendimento que tenho lá em Porto Alegre no Hospital de Clínicas já não é o mesmo. Só tem o nome de “Centro de referência em Esclerose Múltipla”, porque o atendimento é ambulatorial padrão, limitado à equipe de neurologia e enfermagem, com consultas cada vez mais rápidas e rasas devido à superlotação, não existe atendimento multidisciplinar, toda e qualquer outra queixa que exista, mesmo que seja derivada da EM deve ser encaminhada para outros especialistas via posto de saúde. No caso de Cachoeira que não tem especialista de nada atendendo na cidade, você tem que rezar que o clínico (olha ele aí de novo) passe por cima do seu ego e aceite te encaminhar para outro médico e esperar uma vida inteira por esse encaminhamento que vai ser um pra cada lugar diferente pra te cansar bem e te fazer desistir.

A única vantagem que ainda existe de ir ao clínicas para as consultas é o respaldo do meu médico por quem tenho confiança e ser atendida por neurologistas, mesmo que sejam residentes e um diferente toda vez. De resto, só serve pra cansar e agravar ainda mais a saúde da gente.

Eu entendo que Esclerose Múltipla (e convenhamos – quase todas as doenças) deva ser tratada multi-disciplinarmente. Não adianta só fazer pulso quando tem surto e tomar o medicamento de controle direitinho. O recente caso da atriz trazido a público e debatido na TV. nos mostra o quanto são importantes o acompanhamento nutricional, psicológico/psiquiátrico, fisioterapias, fonoaudiólogos, cardiologistas, reumatologistas, dermatologistas e outros profissionais. Muitos sintomas e aspectos não são diretamente causados pela EM, mas surgem a partir de. Seja pelo estresse emocional que um diagnóstico desses traz para nossa vida, seja causado pelos remédios que fazemos uso, ou por aquilo que surgiu a partir de uma sequela. Acaba que de um jeito ou de outro, tudo é relacionado, afinal nosso corpo é um só e não peças separadas que compramos sobressalentes no mercado da esquina.

E esse atendimento multidisciplinar só funciona bem se for simultâneo, se os profissionais tiverem contato uns com os outros e preferencialmente em um mesmo local ou próximo. Mas isso tudo já é difícil pagando caro, no SUS então, é utopia pura. Tudo demora, tudo tem que enfrentar madrugada em fila, insistir. Se a gente só tivesse isso pra se ocupar na vida já seria difícil, mas agente ainda tenta e insiste em viver uma vida normal, cuidar da casa, da família, trabalhar, estudar. Torna-se tudo tão exaustivo e frustrante que eu já desisti.

Por isso que eu dificilmente terei a vida saudável e produtiva daquelas pessoas que aparecem na TV e tem Esclerose Múltipla e correm maratona. Não depende só da minha vontade. Eu preciso escolher minhas batalhas e minha prioridade agora é economizar minhas parcas energias as minhas filhas e minha família.

Não gosto muito de falar sobre isso. Em geral, as pessoas não compreendem. Acham que tudo é mimimi, vitimização e desculpa de preguiçoso. Não é. É a minha realidade. Eu poderia acrescentar muitos outros detalhes que validariam o que tento lhes dizer, mas seria um post de 12 páginas e não quero deprimir ninguém. Eu mesma, apesar de sofrer de depressão e ansiedade, sofro de otimismo incorrigível. O que muitos consideram como uma atitude derrotista da minha parte, na verdade é bem ao contrário. É a aceitação da minha realidade como ela é. A resignação diante daquilo que, pelo menos por ora, não posso modificar e a tentativa de viver bem e ser feliz com aquilo que posso ter. Eu me irrito, reclamo muito, mas isso é parte de um processo, onde jogo para fora aquilo que me incomoda e abro espaço para o que é bom pra mim.  Não fico dando murro em ponta de faca. Recuar às vezes é a única maneira de- tomada certa distância – conseguir enxergar melhor a solução. Quando a gente desiste temporariamente de uma batalha, aproveita o tempo para buscar novas informações, recursos e forças para voltar a lutar.

Na verdade eu não desisto. Eu supero. Passo por cima disso tudo e sigo em frente. Lá adiante, me deparo com essas mesmas barreiras, mas com mais conhecimento e experiência pra vencer.

Passo trabalho, mas mantenho minha paz. E não preciso correr maratona para ser feliz, nem para ser considerada vencedora. Sou alguém que supera suas dificuldades todos os dias.

 

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N.E.:

“Correr maratona”

Exemplo de coisas extremas que pessoas com muita força de vontade e condições favoráveis conseguem fazer apesar da EM. Em nenhum momento usei o termo de forma pejorativa. Admiro quem consegue chegar nesse ponto.

Sinônimo de superar:

1: Ser superior:  exceder, suplantar, ultrapassar, passar, sobrepujar, sobrelevar, avantajar-se.

2: Vencer:  vencer, dominar, bater, derrotar, subjugar, sujeitar, conquistar, jantar.

3: Solucionar algo mau:  solucionar, livrar-se, afastar, remover, cortar, debelar, desfazer, destruir.

4: Ir além: galgar, elevar-se, ascender, alçar-se.

 

 

 

 

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